Cadê meu WiiU?
Lembro como se fosse ontem: lá estava eu, quieto em meu apartamento, sem sinal de TV e de Internet após uma tempestade fortíssima que deixou a capital de São Paulo bem menos verde do que já era. Sim, nossas poucas árvores existem, e quando uma ou mesmo parte delas resolve cair em uma tempestade, é quase certo que ela vai levar junto aquele emaranhado de fios que vai deixar muita gente sem energia elétrica, sinal na TV e, obviamente, internet. Coitada da árvore…
A energia elétrica demorou até a manhã do dia seguinte para voltar. Pelo menos o banho quente estava garantido mas, ainda aguardando pelo retorno dos outros dois itens, liguei meu PC, mas o ócio ocasionado pela falta da interação logo me fez perder o interesse pela tela. Levantei os braços, dei uma bela e longa espreguiçada, pensei em jogar algo pra passar o tempo, ou ler alguma revista ou livro. Que tal dar aquela organizada na bagunça? Nah… Uma olhada em volta me fez perceber que o escritório estava bagunçado o suficiente para que essa última ideia sumisse da minha cabeça. Mas algo em meio àquela bagunça toda havia me chamado a atenção.
Quase não dava para vê-lo. A preguiça era monstruosa, estiquei o braço de maneira vergonhosa enquanto dava aquele bocejo, quase caindo da cadeira empurrei um montinho de revistas pra cá, um notebook pra lá… Eu já sabia que era ele, mas um cálculo rápido do tempo em que ele esteve ali, imóvel, esquecido, me deixou surpreso. Meu querido Nintendo WiiU, comprado num sábado, a um ótimo preço, após uma maratona inesquecível pelos shoppings da capital atrás de uma promoção.
Veio com New Super Mario Bros U + Super Luigi U, que joguei bem pouco por sinal… Acho que minha vibe era outra. Que os jogos de plataforma ficassem para as antigas gerações, pois naquele momento, eu queria algo mais atual e esse algo chegou pouco tempo depois de uma conversa com certo amigo que me vendeu ZombiU, e quando o jogo chegou, eu me apaixonei pelo tal console.Naquela geração, eu havia decidido não comprar consoles da Sony e Microsoft porque eu estava meio que enfeitiçado pelo Steam que rodava maravilhosamente bem no meu PC semi-gamer. Mas e o tal do WiiU da Nintendo? Esse era obrigação, era manter a tradição e garantir que nenhum Zelda me passaria batido! E a princípio, com ZombiU, a jogatina em duas telas nunca me pareceu tão plausível e real, sem perfumaria. A coisa toda acontecia em tempo real, e a ambientação e a imersão eram totais: a segunda tela desviava a nossa visão da tela a todo momento e imergir em um ambiente escuro, sujo, e lotado de mortos vivos canibais prontos para pular no nosso personagem enquanto a gente olhava no tablet procurando algo no inventário era realmente aterrador, algo que absolutamente nada naquela geração toda conseguiu, se quer, igualar. Inclusive a falta dessa “distração” causada pelo tablet foi o que estragou as reedições do jogo, mas em fim… O tempo passou, a Nintendo revelou o Nintendo Switch em um vídeo cheio de gente feliz e, fora isso, a única coisa que eu penso é que não fazia tanto tempo assim que o WiiU havia visto a luz do dia pela primeira vez… Mais ou menos 4 anos antes.
Algo deu errado, isso é óbvio. O aparelho foi um fiasco em vendas, e hoje detém a pior base instalada dentre todos os consoles caseiros da empresa.
Tá, mas o que foi que deu errado?
Mas lá estava meu WiiU, abandonado em meio à bagunça, o tablet totalmente descarregado, mas limpinho graças aos serviços da moça dava um tapa no apartamento de vez em quando. Me esforcei para lembrar qual havia sido o último game jogado ali… Fatal Frame, não o jogo, a demo. Eu até havia gostado de banir assombrações com o tablet, o uso como câmera ficou excelente, mas não o suficiente para me fazer gastar a fortuna que seria necessária para adquirir a versão completa na época!
Me bateu então uma dúvida: ligar ou não? Fiquei ali espreguiçando mais um pouco enquanto decidia, e foi quando um pensamento apareceu aleatoriamente em minha mente. ZombiU e Fatal Frame, praticamente primeiro e último games que joguei no console, haviam sido os dois únicos títulos que me fizeram realmente acreditar que a telinha do gamepad poderia ser usada para funções que fizessem valer o que paguei pelo console. Qualquer outro jogo dos não muitos que joguei na plataforma, ou não faziam uso de qualquer função que não pudesse estar em um menu na tela da TV, ou tentavam fazer um uso mais original só que com resultados trágicos, e me pareceu, então, que o reflexo disso havia culminado naquele novo console da empresa, um substituto ou, talvez, uma correção.
Eu, ali, olhava para um defunto, um zumbi, um console que logo seria descontinuado por tentar, mais uma vez, apostar somente na jogatina diferenciada. Claramente não havia dado certo, faltava um algo mais. Hoje sabemos que esse “algo” era uma tela portátil totalmente independente de verdade, com maior resolução e que pudesse funcionar verdadeiramente como um console de bolso, mas na época, a gente pensava um monte de causas prováveis, como potência para igualar os concorrentes, por exemplo.
O console definitivamente era cheio de altos e baixos. Grandes franquias da empresa ficaram de fora da farra, outras não deveriam ter entrado nela. Pensei que o Miyamoto deveria ter dado um breque no saquê… O quê fizeste com Star Fox, oh nobre Guru dos Games? Pelo menos aquela vergonha alheia encarnada em robôs desengonçados não saiu do papel. Menos mau.
Naquela altura do campeonato, eu definitivamente não iria ligar o aparelho… Não iria me dar ao trabalho. Meus jogos já haviam sido vendidos, sobraram alguns na memória do console apenas, mas nada que eu já não tivesse no Steam. Santo Steam… Que negócio genial aquilo! Hoje estou meio off dele mas estou voltando com força agora mas bem, o assunto é WiiU, e voltando a ele, eu não me cocei nem para ligar o carregador na tomada. E olha que e eu estava vendo a tomada e o conector ali, em baixo da mesa, dava pra cutucar eles com os pés. É, eu estava realmente com uma preguiça daquelas! Estiquei a cabeça para trás e tentei lembrar o que mais o console havia tido de bom. Exclusivos, claro, o resto não importa. Nada de levar em conta jogos da metade da geração passada, ou indie games que são muito mais baratos no PC. Isso talvez importe pra alguém, não é o meu caso, pois o que eu queria mesmo nunca apareceu: Tomb Rider, Street Fighter V, Dark Souls III, qualquer coisa da Bethesda… Nem em sonho.
De exclusivos, me veio à cabeça imediatamente Super Smash Bros U, um jogo que reconheço a importância, mas que, desde seu surgimento no N64, nunca me apeteceu. O novo Mundo 3D do Mario, que apesar de ótimo, mais me pareceu um retrocesso daquilo que vi em Mario Galaxy 1 e 2 do que uma evolução… Mario Gatinho? É, na época eu achava que estava realmente ficando velho e chato demais, mas aí, quando vi Mario Odyssey no Switch eu percebi que a evolução que eu esperava pulou um console. Teve o jogo do Toad como protagonista caçador de tesouros, um game que me chamou a atenção, mas que me causou dúvidas quanto a valer ou não o investimento. Esse maldito dólar que nunca baixa… E ainda não baixou! Santo cristo! Continuando, Fast Racing Neo, o último game que comprei e joguei por 3 dias para não mais encostar no jogo. Sim, era bom, surpreendentemente bom, mas curto demais e deserto no modo online. Juro que minha mente não conseguiu se lembrar de algo mais, nem ruim, nem bom. Onde está a biblioteca desse videogame? Realmente foi só isso?
Então franzi a sobrancelha esquerda, e levantei a direita… Geralmente eu faço isso quando penso “mas por outro lado…“. É, por outro lado até que não foram poucos. Nestes quase quatro anos de vida, me lembrei de uns 15 games, sendo que uns 10 foram produzidos pela própria Nintendo e suas agregadas, e tenho certeza que esse numero aumentaria um pouco mais se eu me esforçasse para lembrar… É, teve aquele jogo do Yoshi de lã, e Splatoon, Mario Maker, e como fui me esquecer do maravilhoso e perfeito Donkey Kong Country Tropical Freeze? Ops! Pareceu então que eu havia acordado um pouco e a mente havia voltado a trabalhar menos preguiçosamente. Independente de ótimos, bons ou ruins, a Nintendo deve ter lançado, de seus próprios estúdios, uns 20 jogos para o console. Levante a mão a empresa que em 4 anos de vida, lançou 20 jogos próprios em algum videogame… Talvez a Ubisoft, com 5 ou 6 versões diferentes de Assassins Creed e Just Dance por ano.
Desfranzi as sobrancelhas, pensei até que deveriam ter sido suficientes… São 5 jogos para cada um dos anos que o console durou. É realmente uma pena que ele não tenha tido o menor apoio das outras fabricantes, provavelmente foi o que decretou o seu fim. Sem os grandes jogos do mainstream, fica difícil competir. E lá vem o Nintendo Switch, com a promessa de tudo isso que faltou no WiiU e muito mais… Será que agora vai? Será este um console sem falhas? Um aparelho definitivo e livre da síndrome da morte precoce, velha conhecida dos fãs da empresas? Essa dúvida já ficou para trás, apesar de que gostar da Nintendo me fez uma pessoa desconfiada. Desconfiada, mas feliz.
Verdade que ainda faltaram muitas outras caras neste videogame. Acabou o tempo, nada de Capitão Falcon fazendo curvas a 1300 MPH em sua Blue Falcon no WiiU, ou Samus Aran caçando algum Metroid contrabandeado pela galáxia… Se olharmos o elenco de Super Smash Bros U, vamos ver uma penca personagens que só deram o ar da graça por ali mesmo, sem protagonizar ou aparecer em mais nada no console. No pouco tempo disponível, quem apareceu, pelo menos na maioria dos casos, fez bonito. Bigode, Donkey, Link… Chega de espreguiçar, chega de contorcionismo, hora de acordar de vez: não é que, apesar de ser um fiasco comercial, aquele console realmente tinha me divertido? Foram centenas de horas gastas em Mario Kart 8, dezenas de noites a fio tentando fazer o melhor final de ZombiU, muitos palavrões e maldições conjuradas para fechar Bayonetta no Hard, nem preciso dizer nada de Tropical Freezy e seus terríveis templos secretos destruidores de vidas (e amizades, e lares, e famílias).
É, foi muito bom jogar esse tal de WiiU.
lembro que fiquei olhando fixamente para a telinha do gamepad, viajando… Sabe? Quando, sem motivo aparente, ficamos imóveis olhando para um ponto qualquer com cara de paisagem? Só percebi isso ao sair do transe. Soltei um sorriso estranho, meio satisfeito, meio inconformado. Bem que a realidade poderia ter sido outra…
Não foi, e só restou esperar pelo derradeiro game do sistema, a até então, novíssima aventura do Herói do Tempo. Na época eu ainda não sabia se iria demorar, e nem se eu conseguiria juntar barras de ouro suficientes para comprar o jogo… Na real, eu cogitei até mesmo não comprar o jogo e guardar o dinheiro para adquirir um Nintendo Switch. Definitivamente eu não sabia naquele momento, mas me sentia grato. Me sentia bem. Me sentia afortunado por ter jogado os grandes títulos daquele peculiar aparelho. Resolvi então esticar um pouco mais a perna, e com o pé direito, peguei o cabo de energia do carregador do gamepad. Com o pé mesmo o encaixei na tomada, foi muito mais fácil do que eu imaginei… Ou tive sorte.
Deixei ele carregando. Não custou nada mesmo, mas momentaneamente tirou dele aquele ar de abandonado. Depois do ultimo ato, ele voltaria para a sua embalagem, e este último ato era só um tal de Breath of the Wild, que eu jogaria à exaustão para só então, desligar definitivamente o console para que ele passasse a fazer parte dos meus itens de coleção, tanto porque eu só guardo consoles que, de alguma maneira, me marcaram, e o WiiU, no final das contas, fez o suficiente para isso.
Finalmente levantei da cadeira, percebi que precisava de uma última espreguiçada. Foi a melhor de todas! Então, fui tomar um banho quente. O medo de outra árvore cair e a energia acabar era grande… Banho de canequinha ninguém merece!
Fim.
O slogan do antigo RetroPlayers ainda vale pra mim: “também to morto mas tô aí!”
E muito bem acompanhado =)
testando!